sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Aprender de tanto aprender...


Aprender, já não sei dizer o quanto me basta e o tanto que me serve. Sei o quanto me cansa, tanto quanto me estimula.

Uma vez, nos idos de 2001, questionei um amigo de faculdade sobre que livros eu deveria ler para ser tão inteligente quanto ele. Eu queria uma lista, um ‘por onde começar’, para aos poucos ir adquirindo aquela capacidade criativa de ver com meus olhos próprios (que hoje sei que são tão pouco meus...), de conseguir ouvir uma palestra e poder entendê-la, de poder abraçar ideias sem ser preconceituoso! Enfim, o que eu queria naquele momento era um manual para aprender a deglutir informações, assimilar novos conhecimentos e aprender a desenvolver-me intelectualmente. Eu estava me encaminhando para um mundo infinito...

O pequeno príncipe”, foi o livro que ele me indicou para começar e eu não levei tão a sério a dica quanto deveria, porém, li o livro, em 2014 ou 2015, um pouco tarde demais talvez. Mesmo assim consegui captar o porquê de sua dica e hoje sei o que os livros fizeram por mim. Aliás, a influência dos livros em mim é tão grande quanto a dos filmes. Quem eu sou é resultado de todo um arcabouço cultural adquirido ao longo dos anos de estudos que se iniciaram no distante ano de 1987, quando ingressei na pré-escola.

Conhecer novas pessoas, lugares, horários e regras, cores e sons, foi o que a escola me propiciou. Uma nova socialização a cada dia e, mesmo em momentos supostamente iguais, aprendia coisas diferentes. O medo que a religião me impunha levou anos para desvanecer, assim como uma criação familiar simples forjou lentamente em mim valores indissociáveis de quem eu sou. Acredito que cada pessoa deva se formar de maneira semelhante, afinal, não devemos ser tão diferentes uns dos outros. Bem, não deveríamos, econômica e socialmente falando, mas este é outro assunto.

A escola foi me moldando e aos poucos fui aprendendo a fazer minhas escolhas de forma mais sólida concomitante à insegurança característica de errar, cair e levantar. Algo normal. Cicatrizes são para lembrar-nos que não podemos ser perfeitos a todo instante. Amigos foram e vieram. A escola juntou o trabalho e a responsabilidade, o mundo foi aumentando na medida em que meus passos foram alargando-se para novos horizontes. A faculdade completou outros espaços e elucidou universos dissonantes que jamais havia sonhado, embora eu já soubesse que não poderia sair da universidade no mesmo formato quadrado que era quando entrei. Como diria um grande professor meu, o mundo é redondo e as salas de aula são quadradas. Arredondar-me foi algo muito bom, dolorido em muitas vezes como o é até hoje, contudo, é a necessidade de ser melhor a todo novo dia que ‘me arredonda os cantos’. Tudo bem que Raul disse “melhor ter nascido burro, sofria menos”, mas será que quem não sabe sofre menos? E como saber que não se sabe? E saber mais, nos torna mais felizes, nos torna pessoas melhores? Para quem?

São quase trinta anos de escola, estudo e mais estudo, um acúmulo dantesco de informações que me causam uma abismal depressão e uma estonteante euforia. Talvez seja por isso que escrevo tanta poesia para, no fim, nem saber ao certo o que elas dizem para mim. Quem dirá aos outros?!

Continuo a aprender, pois sou humano e aprender é inerente ao meu ser, ao nosso ser. Assim vou aos poucos compreendendo todos os documentários que assisti, tanto quanto aqueles filmes cabeças que põem em xeque nossa percepção de realidade e de objetividade. Da mesma forma tantas músicas, filosofia e poesia cerceiam o abstrato de minha subjetividade. Ao mesmo tempo me liberta.

Se você assistir os documentários que eu assisti vai ouvir frases que dizem coisas bem “hippies”, ou coisas bem “indígenas”, ou coisas bem “uau, que doideira!”. Mas e aí, isso diz algo? E os filmes nos dizem o quê? E os livros? Ou mesmo ciência e filosofia, o que querem para nós? Aliás, se política e religião não conseguem elucidar o mundo para que você tome decisões próprias, então você precisa entender, se aprofundar em si mesmo e rever-se enquanto pessoa. Para mim é indubitável que o conhecimento pode tanto te libertar quando te prender e consigo entender perfeitamente porque muitas pessoas desistem no meio dos caminhos que suaram tanto para construir, ou simplesmente enlouquecem. Todo conhecimento é sedicioso e sedutor. Na melhor das hipóteses ouvir-se pode ser o máximo que você precisa e às vezes o menos necessário. Que garantias você pode ter, afinal, de que é você mesmo quem diz o que você precisa escutar?

Ter uma vida normal, em muitos casos, é o mais desejável possível. Alegrar-se com as pequenas coisas, um lugar-comum da autoajuda pode ser o totem do maravilhamento próprio. Enlouquecer um pouquinho a cada mês pode ser o santo remédio para aliviar as dores de não conseguir parar de aprender todo dia.

Eu apenas deito na rede e esvazio minha mente... Ela se enche e assopro os pensamentos embora. Lá se vão linhas de um novo poema e deixo um pequeno sorriso de nota de rodapé.

“_ O que tu tá fazendo pai?”
“_ Nada.”
“_ Nada?”
“_ Aham. Nada. Só isso...”


Wagner Fonseca, 12 de fevereiro de 2016.
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quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

Escola e progresso na obra “Cazuza” de Viriato Corrêa



Capa da edição nº 34, de 1986
O livro “Cazuza” conta uma história infantil do Brasil da década de 1930. Foi o período da Era Vargas, do nacionalismo, do modernismo, da ideologia do progresso e do patriotismo. A obra de Viriato Corrêa encarna os pressupostos citados e sobre eles destila inúmeras falas de embevecimento. Analisando-a pelo olhar externo, podemos distinguir claramente a formação moral de uma época que se pretende forjar uma identidade nacional para um vultoso futuro. Se, contudo, usarmos apenas filtros internos, perceberemos que a mesma formação moral mantém-se lá a evidenciar e enaltecer uma visão de progresso.

Cazuza é o menino simples do interior distante, do povoado esmaecido no mapa, quando se há o registro. O lugar em que vive esta primeira etapa de sua infância localiza-se nos sertões do Maranhão. Terra de coronéis, de uma vida dura para muitos, de escolaridades precárias. É onde tem seu primeiro contato com as letras e onde sonha com uma fantasia de escola. A realidade, porém, destrói seus sonhos: na escola atrasada do interior o professor é a lei dentro da deteriorada sala de aula e a palmatória é sumidade inflexível e indiscutível. O analfabetismo reinante e a rudeza do lugar corroboram para criar uma imagem quase oposta ao ideário civilizatório. O progresso, quando chega, é na figura do médico a aviltar ânimos e curar doenças que são, por vezes, despercebidas. Medicina e ignorância opõem-se. A família de Cazuza não tarda a mudar-se do povoado. Sua história parece então o emblema linear de um progresso gradual, porém determinado a galgar seu merecido espaço.

Cazuza muda-se com sua família para a vila. Os tempos de palmatória ficarão para trás, juntamente com as amizades e as lembranças. Cazuza aceita tudo com simpatia e um sorriso doce no rosto. Toda novidade é encarada com a maior alegria possível: o novo contagia, amplia horizontes e cria um espasmo eufórico de futuro. O menino quase bruto do povoado embrutecido caminha agora um passo, pequeno talvez, mas muito importante, para um mundo maior, aparentemente mais livre e também mais organizado.

A escola da vila corresponde aos sonhos da infância pré-escolar: é colorida e vívida, educa ao invés de castigar, orienta e forma pessoas melhores. As professoras possuem uma formação mais humana e, concorrendo com toda a carestia estrutural – desde instalações físicas até condições próprias de sobrevivência – fazem da escola o berço do amanhã mais justo da grande pátria. Os castigos da palmatória são substituídos por fábulas edificantes, por histórias e conselhos pontuais sobre causas e efeitos e, porque não, crime e castigo. Para um país que se quer grande não basta punir, urge edificar bons homens para a posteridade. O narrador Cazuza pontua distintamente cada momento enaltecedor. Antes um menino bruto, embora amável; agora um menino educado, pronto para um passo mais largo do progresso.

O progresso é urbano e vive longe dos sertões e povoados opacamente mapeados do Brasil na primeira metade do século XX. Para cumprir seu destino ao progresso, Cazuza abandona mais uma vez os seus e, a revelia de suas lágrimas, acena sorridente ao novo que vislumbra: a capital São Luís. Embora ainda interiorana, São Luís representa naquele momento o progresso maior e é onde Cazuza estudará, no internato. Entretanto, nada há que se compare aos rigores atheneicos: na nova escola, mais do que nunca, a educação liberta o homem para seu ideal maior de ser civilizado. É na nova escola que os discursos mais se avolumam e mais se cristalizam. As diferenças sociais são atenuadas, naturalizadas e distinguidas meramente como acaso ou condição de esforço e vontade. Ricos e pobres são tratados quase que igualmente e, como na escola da vila, o castigo físico pelos erros é rígida e sofisticamente substituído pelo discurso moral. A pátria é engrandecida pela narrativa enobrecedora dos grandes vultos da história. A história de Luís Gama é emblemática: na grande pátria Brasil há o espaço garantido daqueles que fazem por si. Num arremedo quase fantástico, o nobre rende-se ao pobre na disputa pela medalha de ouro. Quem disse que um rico não possui sentimentos e humildade para reconhecer o brio e força de vontade do pobre que, apesar de todos os percalços da vida, consegue se lhe mostrar superior?

Viriato Corrêa consegue em sua obra amalgamar o ideário de uma época. O movimento escolanova, o discurso nacionalista e patriótico de Vargas bem como a exaltação liberal do progresso modernista. As críticas miram poucos alvos, justamente aqueles que se contrapõe ao “espírito” da época. Ao narrar os fatos de uma infância que se remodela do interior para o urbano, Corrêa narra também a história do Brasil: a infância colonial do povoado bruto para a escola edificante do mundo urbano. 

Referência: CORRÊA, Viriato. Cazuza. 34º ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1986.


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quarta-feira, 3 de fevereiro de 2016

O vazio do hoje




O hoje está muito diferente, muito distante do ontem que vivi. No ontem as pessoas se cumprimentavam, as pessoas visitavam-se entre si e compartilhavam vida entre si. Também dividiam feridas abertas e costuravam as mazelas que abriam.

Não, não quero apena culpar a atualidade, porém eu sinto seu peso e vejo pessoas que também o sentem.

Tirar o telefone do gancho e ligar para seu amigo onze horas da noite e ficarem uma hora conversando sobre as mesmas coisas que sempre conversaram. Aliás, nunca precisou mudar o assunto, não precisava tanta versatilidade intelectual. Bastava assistir algum filme alugado na locadora pra botar rodar no videocassete e lá vinham inúmeras teorias sobre Matrix...

Ou virar a noite jogando canastra, bebendo cerveja que não fosse cara, afinal, eu sempre estive em crise e isso não é de hoje. Nunca fui rico e nem pretendo. Rico materialmente falando. Acho que a pobreza... Não, não pobreza, humildade talvez, ou melhor, a simplicidade de ser, a vida longe das grandes cidades, acho que tudo isso nos fazia melhores. O pouco que tínhamos era o suficiente para tanto tempo!

Quando criança provava iogurte uma vez por mês e hoje vou ao supermercado e pouco me importo se está lá na prateleira ou não. Não, não é porque cresci, pois continuo sendo fanático por iogurte e os sabores só evoluíram!

Jogar bola ou andar de bicicleta sem rumo era o que havia, principalmente no verão, uma vez que praia não era nossa primeira opção. Na verdade praia era significado de festa e festa era algo que contávamos nos dedos! O que alegrava mesmo eram as festas juninas ou os bailes que íamos no centro de nossa diminuta cidade. Muitos daqueles que desfilavam com suas roupas caras hoje são pais e mães um tanto infelizes com o mundo de festas de seus filhos. Outros se adaptaram. Seria mais sincero dizer que a maioria se adaptou aos novos tempos e outros ainda são como eu, ouvindo as músicas antigas, por exemplo.

O hoje é uma panaceia de sentidos e sentimentos. Tudo misturado, perto e distante ao mesmo tempo. O prazer de caprichar na pose da fotografia não é mais o mesmo, porque naquela época levaria tempo até ser revelada e a torcida para ficar uma boa foto era grande! No hoje as pessoas viajam e o prazer maior parece ser fazer a fotografia para postar nas redes sociais. E quem consegue fugir disso que revele a primeira foto!

No hoje seus amigos estão no facebook, no whatsapp e ainda assim estão distantes de nós, uns dos outros. O incrível mundo virtual não é tão grandioso como pensamos, a não ser pelo fato de distanciar infinitamente as pessoas. Quem consegue manter seus amigos por dois, três ou quatro anos seguidos é um herói. Vejo meus alunos e alunas e como muitos ‘trocam’ suas amizades de tempos em tempos. Não deve ser amizade, na verdade. Eu continuo com meus amigos de infância, de adolescência, das "baladas" e agrego novos amigos. Obviamente alguns se vão e outros são apenas colegas que manterão contato regular por um tempo apenas.

Já dizia o comercial de banco nos anos 80, ‘o tempo passa, o tempo voa’, e no mundo corrido que temos, o tempo voa muito mais rápido.

Não deixe que trabalho e sonhos de acúmulo te distancie dos teus amigos e familiares.

Responda aos seus amigos as mensagens que eles te deixam e não carregue tanto rancor. Há pessoas boas e ruins e sempre haverá que os ame e cada um de nós jamais irá agradar a todos. Ser bom é algo difícil, ouvir calado, não julgar, tentar entender as razões alheias, são todas coisas complicadas, mas necessárias. Às vezes precisamos respirar fundo, suspirar profundamente e simplesmente aceitar. Outras vezes precisamos reagir, resistir e mesmo deixar o tempo agir sobre nossas faltas e as faltas dos outros. Inevitavelmente erraremos e mesmo sem querer causaremos mágoas.

Talvez o melhor de tudo seja desligar o computador, desconectar a internet, deixar o celular de lado e ir até o seu amigo, visitar a sua família e não apenas esperar pelo dia da despedida final, pois lá as lágrimas estarão nos acompanhando e elas devem ser leves. Lágrimas pesadas surgem de dois fatores: dos nossos erros e de nossa distância. Cada fator dói de um jeito diferente e vencer o rancor é mais difícil do que vencer a distância e mesmo assim, mesmo em tempos de redes sociais, deixamos a distância crescer cada vez mais entre nós.

Estar presente, no hoje, é muito mais importante do que foi em qualquer época!
03/02/16



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