terça-feira, 12 de agosto de 2014

Professores enrascados



Minha luta como professor torna-se a cada dia mais complexa, e porque não dizer, mais complicada. De um lado o pensamento de esquerda dos dirigentes sindicais, de outro lado o pensamento de direita de todos aqueles que culpam os professores. Ambos, porém, criticam o governo. 

Aos esquerdistas tradicionais, o governo investe pouco em educação, seja na estrutura física e didática, seja no salário dos professores. Daí surgiu também a briga por 10% do PIB para a educação. Eu, particularmente, acreditei nisso, porém, em seguida desacreditei. E por quê? Porque empreendi uma greve de 62 dias pelo cumprimento integral de uma lei (UMA LEI!) que garante o piso (!) para nossos salários. Não posso e não consigo acreditar num governo que precisa criar uma lei para que professores possam ter um salário melhor. Pior ainda é esperar algo de um governo que se nega a cumprir integralmente tal lei. Esperar, então, que sejam investidos os 10% do PIB é quase sonho... 

Aliás, é o ponto onde queria chegar. Li hoje uma matéria de uma revista onde um conceituado economista discorre mensalmente sobre educação. Na matéria ele afirma o quanto nós professores estamos “enrascados”. Nossos dirigentes nos ludibriaram durante anos e nós seremos cobrados no futuro assim que os 10% serem investidos e os professores não apresentarem os resultados necessários. A sociedade cobrará! Ainda, segundo o mesmo articulista, os professores sofrem da “síndrome de vitimização”, e nesse ponto posso afirmar por experiência própria que ele não está errado. Por inúmeras vezes vi, ouvi e também me vitimizei a tal ponto de odiar essa “síndrome”. Fui criado num tempo em que o trabalho ainda era um valor e por isso valorizo minha profissão. Para tanto, não posso desprezar meus ganhos salariais, do mesmo modo que não posso reduzir minha profissão ao nível financeiro apenas. 

Tanto que já escrevi sobre a educação... Fui contra a avaliação dos professores, hoje sei o quanto é necessária, embora sei também que é apenas um paliativo, não podendo se tornar uma constante. Ela poderia se tornar apenas um “vício”. O que importa é que nós professores precisamos de formação continuada e a partir disso avaliar e reavaliar-nos constantemente.

Não acredito que 10% do PIB pode ajudar a educação. E por que digo isso? Porque a educação não é compromisso único dos professores, tampouco das famílias. A educação é um compromisso social: da família, a célula primeira da sociedade, a base de cada indivíduo, o lar tão matizado, despedaçado e desestruturado. A escola, obviamente, o lócus que deveria ser privilegiado é hoje comparada a uma zona de guerra. Para mim já está muito difícil arrumar respostas do por que os alunos devem estudar. Convencê-los é um calvário... Adicione aos problemas da escola todos os problemas causados por legislações desvinculadas da realidade... 

Quando converso com meus colegas de profissão o que mais ouço é que falta disciplina e responsabilidade. Muitos falam mesmo que deveríamos voltar a lecionar como nos tempos antigos, com cobrança real mesmo e não esse faz de conta que se tornou a educação escolar brasileira. Aos alunos todos os direitos e garantias de se dar bem fazendo pouco ou quase nada. Aos professores, “batatas”. 

A educação é, também, um compromisso dos meios de comunicação, notadamente a televisão e o rádio. Querendo ou não, são tais meios de comunicação que educam as famílias brasileiras, transmitindo-lhes informação política, cultural, científica, artística, religiosa e legal. A meu ver, ligo os pontos aqui do por que investir em educação (10% do PIB) não resultará em benefício. O Brasil precisa de uma revolução, mas ela não começa apenas pela escola ou universidade. Aliás, a universidade merece um tratamento a parte. E da mesma forma a palavra revolução, pois não me refiro a uma revolução comunista (e hoje penso que talvez nunca tenha acreditado nela realmente...), mas uma revolução política e social, uma revolução que transforme o povo brasileiro num ser mais preocupado com questões concretas de sua vida e do seu futuro. 

Nesse ponto me pergunto: qual o compromisso do Estado, dos meios de comunicação e das classes dirigentes deste país com a educação como um todo (escolar, familiar e social)? Ou vamos apenas engolir o papo da direita que acusa a “esquerdopatia” de transformar o povo em massa bestializada de controle rumo a revolução gramcista do Brasil? Aliás, e apenas engolir a ideia liberal de livre mercado e competitividade predatória da Natureza e daquilo que chamamos ser humano? 

Algumas verdades parecem não mudar. Os extremos se distanciam para se encontrar nas pontas: os que ficam no meio, bem, ‘nos meios’, são metralhados impiedosamente. E aqueles em cada ponta mal percebem a “burrice de sua unanimidade”. Ou outra verdade, que jamais devemos generalizar (como eu mesmo o fiz agora acima). Afinal, a livre iniciativa é algo bom, ao passo que a competitividade embasa o progresso. Mesmo assim, um pouco de regulamentação não faz mal algum à ideologia do progresso. 

E, só para recordar, o economista citado anteriormente, professor tira sim leite de pedra. E novamente, sem generalizações, porque enquanto alguns de nós se esforçam ao máximo, uma grande parte se acomoda na síndrome da vitimização. 

Quando assumi meu compromisso em sala de aula o fiz em nome de meus iguais (agora nem tanto, pois minhas condições financeiras melhoraram um pouco), e esses iguais moram e vivem neste país. Compartilhamos uma história de cinco séculos em comum. Compartilhamos um presente caótico e um futuro imprevisível. Em nome desse futuro tento e me esforço em oferecer meu melhor para que meus alunos possam dividir um futuro em comum melhor para nós. É um esforço em vão? Não quero crer nisso, mesmo que seus celulares sejam mais importantes que suas próprias vidas. Eis um ponto que merece também uma avaliação. 

Encerro por aqui. Imponho a mim mesmo este futuro quase intangível como minha ideologia em particular... 

Professor Wagner Fonseca - 02/ junho_14
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