Dentro de mim há um dragão, mas ele não vive mais. Houve
um tempo que esse dragão baforava lampejos rubros do mais puro ódio que um
coração pode emanar. Esse dragão era mais raro que os diamantes tombados com as
pedras milenares que caíam do céu noturno. Mas o dragão feneceu a duros golpes.
Em eras passadas o dragão se acomodava, se conformava,
se resignava até mesmo quando nenhum cavaleiro ousava enfrentar suas garras de
aço cortante. Ele dormia confortavelmente após seu apetite insaciável por
sangue quente encher tanto seus olhos quanto suas narinas. A carne queimada e o
seu perfume de morte o aliviavam.
Era um dragão dos mais insólitos, dos mais hostis e
dos mais fiéis dentro do lema da matança e da destruição. Enquanto o dragão vivia
em mim destruindo tudo de ruim que me acontecia a minha parte mais humana
tentava apenas ser o melhor que um cidadão de bem poderia ser. O dragão era o
deus interior, a sentinela de minha alma imortal, o responsável pelo equilíbrio
interno de meu ser em razão do meu ser externo.
Contudo, o dragão se cansou porque os guerreiros foram escasseando,
desistindo, e lentamente deixaram de acreditar em algo tão arcaico quanto um
dragão que tinha como propósito guardar uma mera alma. O dragão perdeu sua importância
no mundo dos homens. Rompeu-se o equilíbrio interno e trovões rasgaram minhas
veias e nervos.
No início eu achei que o dragão havia apenas
apaziguado seu desejo de carnificina, mas era pior. Do lado de fora de mim nuvens
cinza, dias nublados, sem chuva, sem sol, sem vento, sem intenção alguma. A indiferença
entrou pelos meus olhos e tocou o coração incendiado dos homens que caçavam o
dragão dentro mim. A chama deles se apagou e então perceberam que era insensato
ir buscar a aventura mortal num dragão que oferecia-lhes perigo algum. Porque temer
um dragão incumbido de ficar estanque eternamente em guarda de uma simples alma?
A indiferença atacou a todos e o dragão irrompeu seu sono
profundo e sem fim. Minha alma jaz desprotegida e indesejada. Ela não é objeto
de desejo algum. Não há mais desejo. Não há mais dragão nem violência incontida.
Apenas sentimentos dúbios numa incólume casca de vida chamada corpo.
Suspiros sem arrogância. Suspiros sem ambição. E uma
alvorada desbotada que jaz sobre um deserto de túmulos onde apodrecem
sentimentos tão caros quanto o amor e o ódio, a angústia e sua malevolência, o desânimo
e seus calafrios. Saudades e recordações sucumbem por entre ruínas de lágrimas
fossilizadas e sorrisos esmaecidos misturados ao sangue seco de antigas
batalhas.
Não há mais armas. Não há mais dragão. Não há mais
guerreiros. E a vitrine da alma esquecida e empoeirada oferece seus estilhaços
sem emoção alguma...
Wagner Fonseca, 09 de maio de 2012 - aniversário de 31 anos...

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