quarta-feira, 9 de maio de 2012

Lágrimas do dragão




Dentro de mim há um dragão, mas ele não vive mais. Houve um tempo que esse dragão baforava lampejos rubros do mais puro ódio que um coração pode emanar. Esse dragão era mais raro que os diamantes tombados com as pedras milenares que caíam do céu noturno. Mas o dragão feneceu a duros golpes.

Em eras passadas o dragão se acomodava, se conformava, se resignava até mesmo quando nenhum cavaleiro ousava enfrentar suas garras de aço cortante. Ele dormia confortavelmente após seu apetite insaciável por sangue quente encher tanto seus olhos quanto suas narinas. A carne queimada e o seu perfume de morte o aliviavam.

Era um dragão dos mais insólitos, dos mais hostis e dos mais fiéis dentro do lema da matança e da destruição. Enquanto o dragão vivia em mim destruindo tudo de ruim que me acontecia a minha parte mais humana tentava apenas ser o melhor que um cidadão de bem poderia ser. O dragão era o deus interior, a sentinela de minha alma imortal, o responsável pelo equilíbrio interno de meu ser em razão do meu ser externo.  Contudo, o dragão se cansou porque os guerreiros foram escasseando, desistindo, e lentamente deixaram de acreditar em algo tão arcaico quanto um dragão que tinha como propósito guardar uma mera alma. O dragão perdeu sua importância no mundo dos homens. Rompeu-se o equilíbrio interno e trovões rasgaram minhas veias e nervos.

No início eu achei que o dragão havia apenas apaziguado seu desejo de carnificina, mas era pior. Do lado de fora de mim nuvens cinza, dias nublados, sem chuva, sem sol, sem vento, sem intenção alguma. A indiferença entrou pelos meus olhos e tocou o coração incendiado dos homens que caçavam o dragão dentro mim. A chama deles se apagou e então perceberam que era insensato ir buscar a aventura mortal num dragão que oferecia-lhes perigo algum. Porque temer um dragão incumbido de ficar estanque eternamente em guarda de uma simples alma?

A indiferença atacou a todos e o dragão irrompeu seu sono profundo e sem fim. Minha alma jaz desprotegida e indesejada. Ela não é objeto de desejo algum. Não há mais desejo. Não há mais dragão nem violência incontida. Apenas sentimentos dúbios numa incólume casca de vida chamada corpo. 

Suspiros sem arrogância. Suspiros sem ambição. E uma alvorada desbotada que jaz sobre um deserto de túmulos onde apodrecem sentimentos tão caros quanto o amor e o ódio, a angústia e sua malevolência, o desânimo e seus calafrios. Saudades e recordações sucumbem por entre ruínas de lágrimas fossilizadas e sorrisos esmaecidos misturados ao sangue seco de antigas batalhas.

Não há mais armas. Não há mais dragão. Não há mais guerreiros. E a vitrine da alma esquecida e empoeirada oferece seus estilhaços sem emoção alguma... 

Wagner Fonseca, 09 de maio de 2012 - aniversário de 31 anos...
Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

Nenhum comentário:

Postar um comentário